João Batista da Silva, o Batista da Mangueira, autor de Capoeira, o maior sucesso deste carnaval, está surpreso com a aceitação de sua música. O samba surgiu de uma brincadeira no Bar “Só Pára Quem Pode”, no morro da Mangueira. No conjunto de caixas de fósforos, de muita batucada e de muita gozação surgiu a primeira parte do samba.

Batista, que também é autor do samba-enredo de 1967, o “Mundo Encantado de Monteiro Lobato”, disse que sua surpresa começou já quando a música foi escolhida para fazer o carnaval de rua da Mangueira.

— Agora, depois que o samba foi cantado em todos os bailes, nos blocos e nas emissoras de rádio, a minha surpresa aumentou. Eu fiz o samba como muitos outros “que a gente faz e deixa pra lá.”

João Batista nasceu em Campos, há trinta e quatro anos atrás. Com um ano foi morar no morro da Mangueira e cresceu ouvindo falar em Cartola, Zé da Zilda, Carlos Cachaça e Pandeirinho.

Aos quatorze anos, foi convidado por Nélson Sargento, na época presidente da Ala dos Compositores, para fazer parte da escola, mas eu pai não permitiu.

Batista não esperava tanto sucesso de Capoeira
Batista não esperava tanto sucesso de Capoeira

Batista da Mangueira

Realmente, em 1959, quando João Batista completou vinte e um anos, pediu para entrar na Ala dos Compositores da Manguieira e Cartola marcou audiência com ele:

— Qualquer pessoa que quisesse participar, naquela época, da Ala dos Compositores teria que passar pelo violão do Cartola. Não era fácil, mas eu consegui passar.

As composições de João Batista começaram a partir daí. Neste mesmo ano compôs o samba de quadra “Glória ao Samba” — consegui o terceiro lugar no júri da Mangueira. Todos os sambas de quadra, entretanto, tinham sempre grande aceitação pelo público nos ensaios. Em 1965, o samba “Cansei de Ilusão” foi o cantado no carnaval de rua pela escola.

Com este samba, surgiu a história de Batista da Mangueira, e ele mesmo explica por que:

— Osvaldo Nunes, que esteve na quadra da Mangueira, ouviu o samba e me pediu para gravá-lo. Quando fui assinar o contrato, já encontrei o nome de “Batista da Mangueira”. Daí por diante, todos só me chamavam dessse modo e hoje só me conhecem assim.

Desde 1965 Batista já era conhecido pelo público, mas somente a partir de 1967 que a sua projeção praticamente começou. A Mangueira apresentava o enredo “O Mundo Encantado de Monteiro Lobato” e o samba enredo composto por Batista, Darci e Luis foi o escolhido para representar a escola na Avenida. Batista foi feliz não só por ter sido a primeira vez em que o samba-enredo composto por ele conseguiu vencer, mas principalmente pelo grande sucesso do samba que contribuiu para que a Mangueira ganhasse o campeonato.

Em 1968 o mesmo aconteceu com o samba-enredo “Samba, Festa de Um Povo”, também de autoria de Batista. A Mangueira conseguiu o bicampeonato.

Capoeira

Numa quarta-feira de outubro, após reunião de diretoria, Batista e uma turma de compositores se reuniram no bar Só Pára Quem Pode, ao lado da Mangueira, para tomarem umas cervejas. Como numa reunião de compositores, a batucada não pode faltar, as caixas de fósforos entraram em atividade.

— Nessa noite, todos estavam muito alegres e a brincadeira tomou conta. Pediram-me para compor um samba. Eu parei e pensei. Comecei a falar bobagens: “a Mangueira gosta muito da Bahia, lembra sempre suas tradições e costumes, portanto eu vou lembrar a Capoeira”. Muito sério, enquanto todos riam do meu discurso, eu começei: “Tem Capoeira, na Bahia e na Mangueira. Quem mandou você subir, Capoeira, cuidado que você pode cair, Capoeira.”

E na brincadeira, a primeira parte do samba ficou pronta ali mesmo no bar ao lado da Mangueira. Todos gostaram do ritmo que eu batucava na minha caixa de fósforos e pediram para que eu compusesse a segunda parte. Fui para casa e completei o samba.

— Para grande surpresa minha, tôdas as pessoas que ouviam o samba, gostava muito. Insistiram para que eu o inscrevesse entre os sambas de quadra, mas eu já havia inscrito outro samba, o Curtição. Mas o Capoeira pegou e todos os meus amigos só me cumprimentavam com o início do samba. Fui na Mangueira e retirei o outro samba e inscrevi Capoeira.

A primeira vez que o samba foi cantado na quadra de ensaios de Mangueira foi um sucesso total. Batista disse que a sua surpresa começou ali, pois ele quando fez o samba, compos na brincadeira com a intenção de “fazer e deixar prá lá”.

A aceitação foi tão grande que logo surgiram as propostas de gravação: João Roberto Kelly, Carlinhos da Mangueira, Conjunto Nosso Samba, Pedrinho Rodrigues, Rubens (irmão do Zuzuca) e outras pessoas que Batista sabe que gravaram, mas não sabe quem.

Direitos autorais

Indagado pelas recompensas que recebeu por ter composto um samba que está em todas as paradas de sucesso, além de ser lembrado a todo momento nos blocos de sujo, Batista informou que os compositores concorrem pelo prazer de verem seus sambas bem cantados pelos mangueirenses em particular e pelo povo em geral.

— Sobre o reconhecimento dos direitos autorais, somente daqui a três ou seus mêses é que eu vou saber quanto irei receber. Só espero que dê para que eu compre uma casinha melhor do que eu tenho aqui no morro da Mangueira, pois esta já não está dando para minha família. Mas a casinha tem que ser aqui por perto. Eu não posso ficar longe dessa batucada da Mangueira.

Pela segunda colocação no Festival de Música para o carnaval deste ano, Batista recebeu o prêmio de 7 milhões de cruzeiros. Batista parabeniza João Roberto Kelly por ter conseguido ficar com a primeira colocação, com a música “Israel”. “Muito antes do festival — afirmou — eu já havia previsto que esta música do Kelly seria uma ‘pulga na camisola do pessoal.’”

Batista, a todos instante, diz que o grande sucesso de “Capoeira” não se deve só a animação da música, mas principalmente à Estação Primeira1.

  1. “Batista agradece à Mangueira o sucesso de ‘Capoeira’”. O GLOBO (RJ), 7-3-73. 2º CLICHÊ, p.12 ↩︎