Finalmente um LP com o grande Cartola! Foi preciso que nascesse uma nova gravadora, a Marcus Pereira, para que fosse dada ao fundador da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, ao maior compositor de todos os tempos dos morros cariocas, a mesma honra já concedida a centenas de nomes surgidos com a mesma rapidez com que desapareceram do panorama de nossa música popular.
Aos 65 anos de idade, Cartola mostra neste disco a razão pela qual é uma legenda e uma lenda do samba. A legenda todo mundo entende. Quanto à lenda, explico melhor. Houve um tempo — bem depois de Cartola ter sido descoberto nos idos de 1930 pelos grandes cantores da época — que o sambista desapareceu do morro e do samba. Muita gente pensava até que ele tivesse morrido e vários sambas falavam dele: “Tenho saudades do terreiro da escola/Lindos sambas do Cartola”, dizia um de Herivelto Martins; “Antigamente havia grande escola/Lindos sambas do Cartola”, dizia outro de Pedro Caetano. E Cartola só foi redescoberto em fins dos anos 50 pelo inesquecível Sérgio Porto numa atividade nada condizente para a grandeza do seu nome: era lavador de carros de uma garagem de Ipanema.
Mas hoje todas as pessoas ligadas de qualquer forma ao samba reconhecem a sua importância. Ele não só fundou a Estação Primeira como lhe deu nome e as cores verde-e-rosa: Foi o seu primeiro diretor de harmonia. Um dos seus sambas, “Quem me vê sorrindo”*, foi gravado por Leopoldo Stokovsky para a Columbia norte-americana, por indicação de Villa-Lobos. Villa-Lobos, aliás, era um grande admirador de Cartola e o convidou várias vezes para participar de espetáculos que promovia. Foi parceiro de Noel Rosa e seus sambas foram gravados por intérpretes como Francisco Alves, Mário Reis, Sílvio Caldas, Carmen Miranda, Elizeth Cardoso e Paulinho da Viola. São muitos, portanto, os títulos de Cartola, o mestre de tantos compositores importantes (o próprio Paulinho da Viola o aponta como a sua grande influência). Mas talvez nenhum seja tão expressivo quanto ao que lhe foi atribuído pelo extraordinário Nelson Cavaquinho numa entrevista que me concedeu. Perguntei a Nelson qual, na sua opinião é o maior compositor da nossa música. Ele não hesitou:
— Cartola!
Sérgio Cabral*
CARTOLA
LADO 1
- DISFRAÇA E CHORA
Cartola e Dalmo Casteli - SIM
Cartola e Oswaldo Martins - CORRA E OLHE O CÉU
Cartola e Dalmo Casteli - ACONTECE
Cartola - TIVE SIM
Cartola - O SOL NASCERÁ
Cartola e Elton Medeiros
LADO 2
- ALVORADA
Cartola, Carlos Cachaça e Hermínio Bello de Carvalho - FESTA DA VINDA
Cartola e Nuno Veloso - QUEM ME VÊ SORRINDO
Cartola e Carlos Cachaça - AMOR PROIBIDO
Cartola - ORDENES E FAREI
Cartola e Aluizio Dias - ALEGRIA
Cartola
PARTICIPAÇÃO
Horondino José da Silva (Dino) Violão de 7 cordas
Jayme Thomas Florêncio (Meira) Violão
Waldiro Frederico Tramontano (Canhôto) Cavaquinho
Raul Machado de Barros (Raul de Barros) Trombone
Nicolino Copia (Copinha) Flauta
Gilberto d´Avila (Gilberto) Surdo e pandeiro
Nílton Delfino Marçal (Marçal) Cuíca e caixa de fósforo
Roberto Bastos Pinheiro (Luna) Tamborim e agogô
Jorge José da Silva (Jorginho) Pandeiro e caxixi
Wilson Canegal Ganzá e reco-reco
Joab Lopes Teixeira (Joab) Coral
PRODUÇÃO E DIREÇÃO DE ESTÚDIO
J.C. Botezeli (Pelão)
ARRANJOS E REGÊNCIA
Maestro Horondino José da Silva (Dino)
TÉCNICO DA GRAVAÇÃO
Paulo Frazão
FOTO
Alexandre Silva Bauer e Gaia Piovesan Faro
Gravação realizada nos dias 20 e 21 de fevereiro e 16 e 17 de março de 1974 nos estúdios da RCA do Rio de Janeiro em 16 canais.
DISCO É CULTURA
- QUEM ME VÊ SORRIR, samba de Cartola e Carlos Cachaça, com Cartola e Coro da Mangueira, em disco “NATIVE BRAZILIAN MUSIC”, Columbia N ° C-83 – C-84 (1942); ↩︎
- Contracapa “CARTOLA 1974” ↩︎